segunda-feira, 31 de maio de 2010

Cem Anos e García Márquez


Cem Anos e Gabriel García Márquez
Terminei recentemente a leitura da obra magnífica do García Márquez, que é dele e também nossa, que compartilhamos não apenas de sua latinidade, mas, sobretudo, da capacidade de sonhar, de enxergar a beleza no mundo e perceber que esta realidade ordinária pode ser invadida pela beleza e pelo sonho.
Cem Anos de Solidão me foi presenteado e recebi mais que apenas um objeto de leitura, ou momentos de delicioso divertimento e contato com o Belo; conheci pessoas que farão parte da minha vida de agora para sempre.
Úrsula Iguarán, Petra Cotes, Coronel Aureliano, Pilar Ternera, Remédios a Bela, Amaranta, e claro, o cigano Melquíades, que descobriu mistérios e se divertiu com eles, que é a melhor forma de conhecer mistérios, todos eles, entre outros, me visitam a consciência vez por outra, e me aconselham, e são parte agora, disto a que chamam psiquismo e que tomo cada vez mais consciência do meu exemplar, mesmo que parcamente, e não de uma maneira tão plena como o Aureliano Babilônia.
Sem contar que a edição que me foi presenteada trouxe o discurso quando da entrega do seu Prêmio Nobel, em 1982, e que produziu em mim uma crise e uma reflexão agudas, à medida que evidencia o quanto o Brasil se afasta da história da América Latina, e quão alijados estamos dos demais países que a formam. As razões são várias e conhecidas, a dimensão continental, a língua, os problemas sociais e políticos que são por si só tão desafiadores e uma história recente que nos afastou da consciência da necessidade de lutas que estavam sendo travadas pelos nossos irmãos e que de certa forma eram lutas nossas também.
Lendo este discurso, pude entender que não apenas o Cem Anos só poderia ter sido escrito por um latino-americano, como também, que o que se chama academicamente de Realismo Fantástico só poderia ter seus maiores expoentes na America Latina.
Claro que cada experiência de leitura é única pela razão óbvia de o ser, mas a recomendação desta obra se faz necessária, mesmo que para alguns seja apenas um bom livro, e em um momento tão árido, ler um bom livro já é algo que vale muito a pena.
Cem Anos de Solidão, Gabriel García Márquez, Eu Adoro Isso Cara!

sábado, 1 de maio de 2010

Deus Mora Num Vilarejo ou Sobre Uma Musica Que eu Gosto Bastante


Por volta de 500 a. C. o território de Israel sofreu diversas invasões, o que obrigou a seu povo conviver não apenas com estranhos tomando lugar entre eles, não raras vezes com muita violência, como nos contam seus cronistas. Foram os assírios, os babilônicos, os fenícios, os gregos, os romanos, enfim, sucessivas perdas de autoridade sobre o lugar que chamavam: Terra Prometida.
Como ocorre em todas as civilizações desde tempos imemoriais, os profetas, que são na verdade outro tipo de poetas, desenvolveram uma literatura apocalíptica, que falava da esperança de um Reino que os exaltaria e que destruiria seus inimigos, e que no final dos tempos eles reinariam eternamente ao lado do senhor deste Reino numa era de paz absoluta.
Era a maneira como eles tratavam a violência e todas as angustias que se viam obrigados a enfrentar diariamente.
Mas isto cristalizou-se no que posteriormente se tornaria uma doutrina judaico-cristã, a do Reino de Deus, mas que obviamente não se constitui como outra coisa que não um elemento simbólico que dá algum alento à alma humana, de que não podemos prescindir.
A bem da verdade, de um modo ou de outro, todos esperamos o “Reino de Deus”, e nem precisamos, às vezes, que deus venha junto, dependendo do deus que se nos ofereça, é melhor que não venha mesmo.
A Marisa Monte pode não ter pensado nessas coisas quando escreveu a musica Vilarejo, junto com seus parceiros, mas certamente, seu texto teria sido considerado profético há três mil anos, e talvez o possa ser, ainda hoje, por alguns. Eis a questão, se há um Reino de Deus possível, este seria como ela escreveu, “Toda gente cabe lá, Palestina, Shangrilá”; pessoas que vivem numa realidade absurdamente cruel e os que ainda acreditam na utopia de um reino perfeito na terra. Se há um reino de Deus, deve ser assim, igual a “lares de mãe”, como aquela senhora em Cem Anos de Solidão, do García Márquez, capaz de conter os braços dos filhos, ou netos quando estes estão para cometer uma insanidade mesmo contra seus inimigos, que é isso que também faz a Compadecida de Ariano Suassuna.
Deus mora num Vilarejo, e a Marisa Monte descobriu isso e nos contou. Vou mudar para lá também, vem junto.
Eu adoro isso, cara!